Domingo, enquanto corria o jogo entre Brasil e
Espanha (que não me animei para assistir, mas acabei assistindo), observei nas mídias
sociais um conflito curioso. Quem comentava sobre a partida, se manifestava
como torcedor, comemorava a cada gol feito, virava alvo de certos indivíduos
que se consideravam “legítimos lutadores por um país melhor”. E pensando bem,
esse tipo de hostilidade é parecido com o que acontece com militantes de
partidos, religiosos, e até quem apenas faz comentários simples de algum tipo
de entretenimento (curiosamente, não vejo ninguém reclamar de quem curte
atrações norte-americanas, por que será?). O negócio agora é ir pra rua,
protestar contra todos os problemas do país, e não “relaxar” em nenhum momento.
Mas, quais são mesmo as pautas dos protestos em
geral?
Dentre as várias, está a que é contra os gastos
excessivos da Copa, a manipulação da mídia, e incentivar mais investimentos em Saúde
e Educação. Certo. Agora, isso significa que ninguém mais pode gostar de
futebol, curtir uma ficção, relaxar por algumas horas embarcando em algum tipo
de história? Todos precisam, de uma forma que beira a neura, protestar contra
tudo que está errado no país?
Essa forma radical de ver as coisas é um perigo
para quem se diz consciente. Extinguir todos os partidos realmente vai acabar
com a corrupção? Eliminar a Globo da face da Terra, como muitos sonham, vai
mesmo diminuir a manipulação da mídia brasileira e deixar a população menos
alienada? Não falar mais de futebol, não torcer a favor da seleção, não
consumir qualquer tipo de entretenimento sob o receio do “vampiro da
alienação”, vai mesmo tornar alguém mais consciente dos problemas do país? Extinguir
as crenças religiosas vai tornar as pessoas com a mente mais aberta e
totalmente livre de preconceitos? Protestar apenas na rua é a única forma de
mudar o país?
Posso ter usado um tom até radical no parágrafo
anterior, mas é assim que muita gente age, julgando a consciência política das
pessoas apenas por uma pequena amostra dos seus gostos pessoais e crenças e pior,
vomitando frases revolucionárias com certo ar de superioridade. Acho
preocupante quando o desejo de mudar se torna um grito tão alto que não aceita
opiniões de pessoas que até concordam, mas não são iguais àquela voz, ou não
atuam no mesmo ritmo por conta de limitações ou por terem os seus próprios
conceitos. Às vezes falam mais baixo, ou não falam – escrevem, cantam, se fazem
ouvir de outras formas. E não pararam as suas vidas e nem deixaram de lado tudo
aquilo que gostam por conta disso. Mas se elas estão engajadas na mesma luta e
fazem por onde, a meu ver, isso é o que importa.
Se for seguir esse pensamento radical, ninguém que
participou e participa dos protestos poderá torcer pelo seu time de coração,
nem assistir ou comentar sobre qualquer tipo de entretenimento que gosta de
assistir para relaxar. Aliás, para que consumir entretenimento, quando se tem
um país inteiro para mudar? E aí que entra o ponto principal: alguém por acaso realmente
faz isso? Ah, hipocrisia detected.
Os únicos, a meu ver, que realmente seguiram à
risca esse tal “padrão de vida pró-luta” foram os militantes que no começo dos
anos 70, auge do regime militar e da repressão, foram para a luta armada.
Abandonaram as suas famílias para viverem clandestinamente, em condições
precárias, respirando a causa e sofrendo as consequências 24h por dia. Mas não vivemos
exatamente aqueles tempos e nem, por enquanto, somos obrigados a frear completamente
nossas vidas para lutar contra as causas (Quais mesmo? Você se lembra de
todas?).
Precisamos aprender a separar o joio do trigo. Nem
todo mundo que é fanático por futebol, consome determinados entretenimentos, possui alguma crença religiosa, ou atua em algum partido, é
necessariamente O alienado. A alienação começa quando tudo isso é posto acima
dos problemas do país como uma forte anestesia. E é claro que existe gente
assim e que precisa acordar com urgência. E não é indo para a rua. Antes disso,
é aprendendo a pensar. Ir à rua ou às mídias sociais como um robô que repete
frases revolucionárias feitas, pra mim, não é protestar, e posar com uma
consciência que na verdade não amadureceu.
Em outras palavras, devemos tomar cuidado para que esse
pensamento tão radicalista (e que felizmente ocupa a cabeça da minoria) não continue
a reforçar, agora sob o pretexto da gana de mudança, as mesmas manias de rotulações,
julgamentos e preconceitos a que todos nós somos submetidos, de uma forma ou de
outra, no dia-a-dia. É o velho ditado de não deixar se levar pelas aparências.
A ideia aqui não é defender a Globo, as religiões,
a Copa ou determinados partidos, mas sim, fazer pensar até que ponto boa parte
do povo acordou. Muitos sabem que precisam gritar para mudar alguma coisa, mas no
que diz respeito a pensar primeiro antes de falar, o sono ainda pode estar
profundo...
Danilo Moreira
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FOTO: http://www.artigosecronicas.com.br/o-perigo-de-apontar-o-dedo/ (Google)
Um comentário:
Achei as manifestações legítimas justamente por não envolver um partido específico, e a falta de "foco" me parece mais um repeteco da mídia do que o entendimento próprio. Tanto, que as tarifas dos transportes públicos voltaram aos preços anteriores e muitas leis que estavam em processo de aprovação [leis estúpidas] foram devidamente arquivadas.
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